Desenvolvimento Pessoal

Reconstruindo sonhos

Só quem passa ou já passou conhece a fundo o problema de consumir drogas e se tornar quimicamente dependente, isso é, doente. As drogas não destroem apenas a vida, a saúde e os sonhos do usuário, mas também todo o círculo de pessoas que o amam. O problema se tornou tão grave que diversos planos de saúde, seguradoras e associações passaram a desenvolver campanhas, a fim de alertarem sobre esse mal que não escolhe família, grau de estudo ou classe social. A dependência química é tida como uma epidemia social. Com o objetivo de combater esse quadro tão crítico, médicos, terapeutas, psicólogos e psiquiatras se especializam na reabilitação desses pacientes e oferecem às famílias todo o apoio e estrutura emocional necessárias para vencer a dependência.

Um desses centros de tratamento é a Clínica Cadmo, que possui uma ampla equipe de profissionais especializados e duas unidades de atendimento: uma de internação, em Piraquara, e a ambulatorial, em Curitiba. “Criamos uma proposta de tratamento utilizando as mais recentes técnicas objetivas de avaliação e reeducação comportamental, através de abordagens cognitivas, respeitando sempre a individualidade e a necessidade de cada pessoa”, assegura Dr. Gustavo Sehnem, médico psiquiatra e um dos responsáveis pelo Centro de Tratamento.

O profissional explica ainda que os riscos são maiores na adolescência. É um período de autoafirmação em que surge curiosidade, questionamentos e vontade de experimentar o novo. Dr. Gustavo reforça que o cuidado dos pais nessa fase tem de ser redobrado e devem estar sempre atento às mudanças de comportamento, olhos vermelhos, trocar a noite pelo dia, novas amizades e baixa motivação nos estudos. O doutor ainda faz questão de reforçar que o álcool é uma das piores drogas, está na maioria dos lares e é vendida livremente.

Tratamento

Geralmente, o paciente é encaminhado para o tratamento por um médico ou conduzido pela família. Existem dois tipos de tratamento: a internação na clínica e o tratamento ambulatorial. Dr. Guilherme Pereira da Costa Góis, psiquiatra e que também responde pela Cadmo, explica que no primeiro momento é feito uma triagem para saber qual é a indicação de tratamento. “Trabalhamos caso a caso, não há um padrão, tudo vai de acordo com a intensidade, o tipo de substância e as características do usuário. No caso da internação, o tratamento é feito por etapas: a primeira é a desintoxicação; na segunda, os pacientes são integrados às normas e ao convívio social; a terceira etapa é a conscientização; a quarta e última etapa é a alta”, explica Dr. Guilherme Góis.

A clínica oferece uma grade de atividades ao longo do dia, e os pacientes participam de grupos com psicólogos, psicoterapeutas, arteoterapeutas, enfermeiros, nutricionista e até educador físico. Para o Dr. Guilherme, o objetivo principal do processo de integração é o de alcançar a conscientização a respeito da droga, suas comorbidades, doenças associadas, ansiedade, depressão e sintomas psicóticos, como esquizofrenia, transtorno bipolar, entre outros. “Ter lazer, fazer cursos, exercícios e buscar a espiritualidade também colabora para esse tão almejado recomeço”, afirma o especialista. “Aqui, eles aprendem que não poderão frequentar determinados lugares e nem conviver com as mesmas pessoas, para que não ocorram as recaídas”, conclui.

Preparando para a alta

Esse é o momento em que eles mais necessitam do apoio, por isso a Cadmo oferece suporte aos familiares através de palestras e sessões individuais durante todo o tratamento.
A equipe procura identificar todos os fatores de risco, rotina, horários, alterações de humor e possíveis divergências com a família. “Procuramos atender a essas situações e para isso criamos um grupo de tratamento semanal chamado ‘Prevenção e Recaída’ para trabalhar os riscos”, ressalta Dr. Guilherme.
A quarta e última etapa é o preparo para a alta e o retorno ao convívio social, feito aos poucos. Primeiro eles saem acompanhados com a equipe e depois com os familiares, mas no fim do dia voltam à clínica. Após a alta, eles continuam tendo acompanhamento, mesmo se forem de outro estado. “É isso que vem colaborando para que mais de 70% dos pacientes superem as drogas sem recaídas. O melhor remédio é não usar drogas e ter hábitos saudáveis”, afirma.

A continuidade

Quando o paciente sai e não continua o tratamento, a chance de voltar é bem grande. “Assim é a dependência química, olhamos a pessoa e aparentemente ela está bem, mas nem sempre é o que vemos. O acompanhamento é a chave para superar as drogas e reconstruir suas vidas”, enfatiza Dr. Gustavo.

“Eu tinha 17 anos quando fumei maconha pela primeira vez, depois experimentei cocaína, LSD, lança-perfume e ecstasy. Meu vício na época de faculdade era mais a maconha, usava diariamente; já a cocaína e ecstasy, eu usava nos fins de semana. Depois que me formei, só dei continuidade na cocaína, que chegou a ser diária. Eu queria sentir a liberdade, principalmente perante a minha família, mostrar que eu poderia seguir o meu próprio caminho ao invés do que eles queriam. Mas, sem dúvida, as amizades também influenciaram. Quando eu usava, eu sentia euforia e esquecia dos problemas. Mas depois vinha a depressão e o arrependimento. E começava tudo de novo. A minha família foi essencial naquele momento conturbado – com o apoio deles, decidi dar o primeiro passo e quis me internar. Saí da clínica em abril de 2016. Hoje, disposto, me sinto uma pessoa muito melhor. Sempre devo estar alerta para evitar recaídas, continuo com acompanhamento, pois sei que não existe cura, mas posso voltar a sonhar, trabalhar e praticar esportes”, declara o advogado Alex, de 42 anos.

Paulo*: alerta para toda a vida
“Comecei a beber com 17 anos. Eu bebia porque todo mundo bebia. Tinha que estar na roda. Na época, eu já trabalhava e sustentava meu vício. Durante o uso da bebida sentia que eu poderia fazer tudo, nada era impossível, inclusive no trabalho, porque eu já ia trabalhar alcoolizado. Mas passado o efeito, vinham os prejuízos. O financeiro sempre pesava. Eu topava tudo, sem me preocupar se podia. Além, é claro, de magoar muito a minha família. Consciente do problema grave que eu estava enfrentando, em 2011 comecei a buscar tratamento.
O tratamento sem internações funcionou muito bem para mim. Tive que encarar tudo de frente. Hoje tenho 39 anos, sou formado em Engenharia Civil, faz um ano e meio que não bebo e me sinto ótimo. A cada dia meu cérebro vai se distanciando e apagando a lembrança do álcool, exatamente como me diziam na clínica.
Continuo tendo problemas, frustrações, seja no trabalho ou em casa, porque a vida está voltando ao normal, se é que podemos dizer assim. E é feliz e sóbrio que enfrento meu dia. Sonho com os olhos abertos, faço terapia e procuro não ficar ocioso, porque já vi isso derrubar muita gente. Tenho uma doença que é incurável e preciso seguir alerta para toda a vida”, declara Paulo.

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