Anaplastologia

Reabilitar vidas

Anaplastologia é uma especialidade ainda recente, mas que vem ajudando a reconquistar a autoestima de milhares de pacientes que tiveram perdas ou já nasceram sem alguma parte do corpo

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O que ela mais queria era colocar brincos e poder usar óculos escuros”. Essa frase não é estranha para nós mulheres, afinal já nascemos vaidosas e muitas já saem da maternidade até com as orelhinhas furadas. Mas a história da Geaninne Vitória Schmitt Zanelato, de apenas seis anos, é um pouquinho diferente. Ela nasceu sem as duas orelhas e, consequentemente, com problemas auditivos. Entretanto, essa pequena guerreira nunca deixou de lado a vaidade e a alegria contagiante de criança.

“Desde que ela nasceu, começamos a pesquisar muito e a buscar a melhor solução para o seu problema. Aos dois anos, nossa filha foi a primeira criança em Curitiba a colocar o BAHA (Bone Anchoraged Hearing Aid) em formato de tiara, um dispositivo auditivo que permite que ela escute. Mas a nossa missão ainda não estava concluída”, conta a mãe Débora Giovana Schmitt, de 33 anos.

A primeira ideia era fazer uma reconstituição, na qual é feito um descolamento da pele local com a finalidade de criar um túnel subcutâneo em que será introduzido o novo esqueleto auricular. “Recebemos muitos e-mails de pessoas com o mesmo problema e acompanhamos este procedimento em uma criança de oito anos. Só que o resultado não era o que estávamos esperando para nossa filha. Além disso, poderia dar rejeição e o procedimento todo é bem demorado”, diz o pai Jair José Zanelato, de 41 anos.

A solução veio através da indicação do Dr. Maurício Buschle, cirurgião otorrinolaringologista e chefe da equipe multidisciplinar de implante coclear do Hospital Iguaçu, em Curitiba. “Foi em uma visita ao consultório do doutor para fazer a troca do aparelho BAHA que ele comentou sobre a técnica da Anaplastologia e nos colocou em contato com a Dra. Angela”, lembra o casal, que é de Ponta Grossa.

A  arte da Anaplastologia

É através dessa técnica que portadores de deformidades faciais causadas por traumas, remoções cirúrgicas ou doenças congênitas têm experimentado o resgate de sua autoestima e melhora na qualidade de vida. A Anaplastologia é a arte e a ciência de restaurar partes ausentes ou malformadas do corpo humano através de meios artificiais, permitindo que os portadores de deformidades possam ser reintegrados à sociedade.

Fundamentada na descoberta da osseointegração por Per-Ingvar Branemark, no início dos anos cinquenta, que buscava um contato direto entre osso e implante, sem a interposição de nenhum outro tipo de tecido, os anaplastologistas têm como objetivo reproduzir na prótese a pele e as feições faciais do paciente.

Dra. Angela Munhoz da Rocha, é a primeira anaplastologista a realizar a técnica da prótese auricular implanto-suportada em Curitiba, e explica que hoje é possível confeccionar próteses com a mais alta tecnologia para pacientes com as mais variadas deformidades. “As próteses são confeccionadas com materiais aloplásticos, como o silicone e o acrílico. Elas são artísticas, feitas individualmente, respeitando-se as características anatômicas e a coloração da pele de cada indivíduo”, afirma a doutora.

Foi graças a Anaplastologia e ao trabalho realizado pela Dra. Angela que a pequena Geaninne ganhou, em outubro do ano passado, suas orelhas e brincos. “A melhor coisa foi ver a felicidade da minha filha depois da colocação das próteses. Ela fazia poses, se olhava toda hora no espelho e disse que ia poder usar óculos escuros igual a mamãe e o papai. Se ela já era vaidosa antes, imagine agora”, emociona-se Débora.

A estudante Mayara Machado Antunes, hoje com 19 anos, também recuperou sua vaidade e autoconfiança com a Anaplastologia. Um acidente de carro quando ela tinha apenas dois anos fez com que Mayara perdesse  a orelha do lado direito. De lá para cá, foram várias cirurgias, todas com rejeição. “Foi uma luta diária para que minha filha recuperasse o que ela perdeu com o acidente. Ela correu vários riscos nas cirurgias. Porém, não desistimos”, revela a mãe Erane Machado Antunes.

A prótese auricular implanto-suportada também foi uma indicação do otorrino de Mayara. “No começo fiquei um pouco receosa, pensando em qual seria o resultado, mas vi que valeria a pena. Meus pais me incentivaram muito”, conta a estudante de Farmácia.

“O resultado do trabalho não poderia ser melhor. Até o tímpano, que tinha estourado com o acidente, se reconstituiu sozinho. É uma coisa divina. Antes ela não deixava ninguém chegar perto, agora o humor dela melhorou, está mais autoconfiante e mais carinhosa. Todo o esforço valeu a pena e não devemos desistir nunca e nem pensar que algo dará errado”, aconselha a mãe, Erane. “A minha audição do lado direito é até melhor que a do esquerdo. Estou bem comigo mesma. Agora até aceito tirar foto”, brinca Mayara.

Moldando as próteses

O anaplastologista começa o processo de fabricação da prótese fazendo uma moldagem do defeito e lado contralateral. As moldagens são feitas usualmente com silicone.  O gesso é vazado dentro das moldagens e removido quando seco.  Estes modelos são usados para esculpir a imagem especular de cera ou argila, escultura feita junto ao paciente, provando todo o tempo e fazendo ajustes. Depois, a cera é removida, deixando o molde vazio. Um silicone transparente é misturado com pigmentos e fibras para criar as cores básicas da pele de cada paciente, imitando a translucidez da pele.

O silicone é colocado na área vaga do molde e deixado para curar-se na mesma forma da escultura de cera ou de argila.  Removido uma vez do molde, as cores básicas da pele podem ser realçadas com pintura externa para combinar o lado contralateral e a pele adjacente. Segundo Dra. Angela, o tempo total clínico e de laboratório necessário para criar uma prótese é, em média, de uma semana para cada orelha.

As próteses são instaladas sobre implantes ósseo-integrados de titânio, como os implantes dentários e os de BAHA, e presas aos mesmos por sistemas de clips ou imãs. É um trabalho em conjunto do anaplastologista com os médicos cirurgiões. Como na odontologia, os parafusos de titânio do implante são colocados no osso, na calota craniana, e o osso se integra ao implante com o tempo. Isso garante ótima retenção e estabilidade, assegurando maior conforto ao paciente durante o manuseio da prótese. As bordas finas permitem um acabamento discreto.

A idade ideal para o tratamento protético é a partir dos seis anos, devido a espessura óssea – ao tamanho da orelha não se alterar mais. As próteses duram de um a dois anos, principalmente em países tropicais, pois a luz ultravioleta faz esmaecer a cor das próteses, as quais devem ser refeitas, sem a necessidade de trocar os implantes.

A Anaplastologia tem se mostrado muito eficiente ao longo dos anos, com enorme grau de aceitação e segurança,“muita gente está voltando a sorrir, a viver, a sair de casa e a tirar muitas fotos para registrar os melhores momentos. Graças a técnica”, comemora Dra. Angela.

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