Medicina

Mente sadia, vida produtiva

A medicina e a psiquiatria vêm agora utilizando técnicas meditativas que melhoram o desempenho no trabalho dos pacientes que sofrem com os efeitos do estresse

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Pesquisas mostram que os efeitos do estresse são tão devastadores que podem aumentar em 70% as chances de um indivíduo ser afastado do trabalho. Até mesmo um leve desconforto emocional pode levar uma pessoa a incapacidade funcional se ela deixar que o problema persista por muito tempo, sem procurar por um tratamento adequado.

Esta foi a alarmante conclusão de um estudo conduzido pelo Dr. Dheeraj Rai, da Universidade de Bristol, em parceria com o Karolinska Institutet, de Estocolmo. Sobre os resultados observados, o autor afirmou: “Nós sabemos que doenças como a depressão e a ansiedade são bastante incapacitantes. Mas muitos sintomas relacionados ao estresse não são severos o suficiente para fechar os diagnósticos desses quadros [psiquiátricos]. O estudo demonstrou que essas pessoas [que não chegam a ter sintomatologia suficientemente proeminente para fechar diagnósticos psiquiátricos] estão também com risco aumentado para incapacidade funcional a longo prazo”.

Essas evidências levantam a seguinte discussão: as tensões e exigências da sociedade moderna estariam excedendo a habilidade humana para lidar com elas?

E agora? Como prevenir?

A psiquiatria, uma especialidade médica que alia os avanços e recursos da medicina aos da psicologia, dispõe de diversas técnicas e abordagens para melhorar a qualidade de vida. Porém, estes profissionais não são tão procurados, principalmente, devido ao desconhecimento da população. O psiquiatra ainda é visto, para muitos, como um especialista que vai prescrever medicações fortes ou sedativas durante todo o tratamento, e as pessoas que tratam têm medo de serem vistas como psicóticas ou loucas.

“É essa visão que é quebrada pelos colegas médicos que nos encaminham seus pacientes. As pessoas precisam saber que nem sempre há indicação de utilização de medicação e, quando indicada, é feito de forma muito criteriosa, levando em conta características específicas do paciente, que sugerem um padrão de resposta terapêutica e de tolerância aos efeitos colaterais. Também são realizados ajustes na dosagem ou mesmo trocas de medicação até conseguirmos a melhor resposta enquanto o uso da medicação for benéfico. É muito complicado explicar este tópico, pois varia muito de caso para caso e também porque, infelizmente, há muitas ideias errôneas a respeito. Mas dependendo do quadro precisamos, por exemplo, associar um ansiolítico nas primeiras duas a quatro semanas de tratamento com um antidepressivo para melhorar a tolerância desse paciente, sendo em seguida retirado”, explica Dra. Cláudia Kuhn, médica psiquiátrica.

A ideia de que as medicações são ‘fortes’ vem certamente do mau uso, pois qualquer coisa pode ser ‘forte’, depende da dose ou da aplicação. “Tomar uma pequena dose de um anti-hipertensivo pode causar um grande mal-estar se a pessoa não tem indicação para isso. As medicações existem para corrigir algo. É evidente que se não há no paciente aquilo que o remédio deveria corrigir, ficará sobrando e vai atrapalhar, pois não deveria estar naquele organismo. Ou também nos casos em que interage com outras medicações que o paciente já faça uso, ou por características do organismo ou por outras doenças que ele já tenha. Cada paciente tem que ser muito bem avaliado dentro do seu contexto e reavaliado continuamente até a alta. Não há outra forma”, declara Dra. Cláudia.

É isso o que a boa prática da psiquiatria moderna preconiza, segundo explicação da Dra. Cláudia. Toda a área médica requer minuciosa e criteriosa avaliação do paciente, constante atualização e capacitação do profissional, postura empática e estar verdadeiramente interessado na solução do sofrimento do paciente, bem como sobre as implicações do quadro na vida dele e da sua família. “Uma boa avaliação, aliada a constante explanação e orientação cuidadosa, com a execução de um plano de tratamento e recorrentes reavaliações do quadro clínico do paciente, é simplesmente básico, além de melhorar a resposta ao tratamento e diminuir os riscos advindos dele”, declara a psiquiatra. Tanto a avaliação como o tratamento são feitos em consultas longas, regulares, com toda a atenção do psiquiatra focada no paciente. Para a especialista, é importante fortalecer a capacidade do paciente em lidar com os problemas. “Durante a consulta, trabalhamos a partir da compreensão mútua da realidade e das necessidades do paciente, construindo uma relação terapêutica sólida, que leve o paciente ao desenvolvimento e fortalecimento da capacidade de lidar com situações estressantes e da sua autonomia. Ajudamos no restabelecimento do seu equilíbrio com o progresso do tratamento, além da estabilização neuroquímica quando a medicação for indicada”, completa a doutora.

Segundo ela, a maioria das pessoas que a procuram para avaliação, em função do seu perfil de trabalho, não tem quadros de doenças psiquiátricas, mas sim, padrões mentais e/ou comportamentais que as fazem sentir-se insatisfeitas de alguma forma, seja por algum nível de descontrole, ou por serem pouco focadas ou produtivas. São pessoas que estão muito bem colocadas no mercado de trabalho, mas que percebem que não sabem aproveitar as ferramentas de que dispõem para a vida profissional e pessoal. “Esses pacientes não têm indicação de associação medicamentosa, usa-se apenas abordagens psicoterápicas”, diz Dra. Cláudia.

Embora esteja claro na literatura científica que o aprendizado que se obtém das psicoterapias mais estudadas é algo para toda a vida, também é verdade que requer um grande grau de motivação e envolvimento do paciente. Recentemente, Dra. Cláudia passou a incluir algumas técnicas meditativas que estão sendo estudadas, nas últimas décadas, por renomados profissionais de Universidades como Harvard e Wisconsin-Madison. Estas técnicas têm apresentado boa aceitação e resposta dos pacientes. “Não há mágica. É um trabalhoso processo, mas muito gratificante. Utilizamos algumas das abordagens psicoterápicas mais conceituadas, conforme as necessidades, objetivos e condições do paciente, considerando o momento do tratamento e a evolução do seu quadro clínico”, enfatiza a doutora.

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